quarta-feira, 5 de junho de 2013

Trabalho x Descanso - Irecê discute abertura do comércio aos domingos e feriados

Debates acirrados vem ocorrendo em Irecê envolvendo a Lei Municipal nº 14/2008 que institui o funcionamento dos estabelecimentos comerciais nos horários entre 8 e 18 horas, de segunda-feira a sexta-feira, e entre 8 e 12 horas, aos sábados. A lei de autoria do vereador Pascoal Martins (PCdoB), que foi um posicionamento do poder legislativo de Irecê decidido por unanimidade, determina ainda o fechamento destes estabelecimentos aos domingos e feriados. Ocorre que agora o vereador Paulinho do Destak (PTN) é autor de uma proposta que revoga esta lei, com fins a permitir a abertura dos empreendimentos nestes dias.

Em entrevista ao Jornal da Caraíbas FM, Paulinho fundou seu argumento para a propositura, apontando que muitos empresários estão sendo penalizados. “Durante 65 anos o comerciante de Irecê foi visto como empregador e após esta determinação ele ficou fora da lei, já que muitos não podem cumpri-la. Podemos exemplificar com o caso dos supermercados da cidade, estes nunca obedeceram ao limite de horários porque nunca puderam”, afirma.
De acordo com o presidente do Sindicato dos Empregados no Comércio de Irecê e Região (SECIR), Rafael Sydartha, a proposta de revogação da lei é “fruto de uma velha história”. Tudo começou quando o SECIR moveu uma ação judicial contra os estabelecimentos que não estavam cumprindo a lei nº 14/2008, porém o sindicato perdeu na primeira instância, foi para a segunda e ganhou no Tribunal Regional do Trabalho (TRT).
Todavia a história não termina aí, já que, diante disso, o Sindicato do Comércio de Irecê e Região (SINCOM), instituição que sai na defesa dos empresários, recorreu ao Tribunal Superior do Trabalho (TST), mas este continuou favorável aos trabalhadores e determinou que se cumprisse a decisão do TRT que imputa em multa de 10 salários mínimos por funcionário, no caso de desobediência. Ainda segundo Rafael, a proposta de revogação da lei é uma tentativa do setor patronal encontrar uma saída para esta situação.

Contudo, o vereador Paulinho afirma: “a lei que queremos instituir beneficia mais o funcionário do que o empresário, porque se ficarmos com a lei de 2008 haverá demissões, uma vez que o horário que ela estabelece não pode ser cumprido”. Ele explica ainda que sua proposta é de liberar o comércio a abrir nos domingos e feriados, mas não de obrigar o funcionário a ir trabalhar nestes dias, pois isto seria facultativo. O funcionário iria escolher ir trabalhar ou não. “O empregado só pode trabalhar seis dias consecutivos, no 7º ele precisa descansar. Se ele optar por trabalhar no domingo ou em dia de feriado, ele irá folgar em algum dia da semana. Ele também não trabalhará quatro domingos seguidos, no máximo três, para que haja o descanso no quarto domingo”.
Das tantas polêmicas que a revogação da lei está causando, uma diz sobre esta possibilidade de escolha quanto a ir trabalhar ou não nestes dias. “Quando é que o trabalhador celetista teve escolha na relação de trabalho? A sua única opção é cumprir o que o patrão diz ou ir embora, ser despedido. Assim, se aprovada a abertura indiscriminada nestes dias, voltaremos a instituir a escravidão em nossa cidade”, afirma o vereador Pascoal Martins.
Aqui se levanta o argumento de assédio moral no trabalho, visto que o funcionário, ao recusar trabalhar nestes dias, poderá sofrer insinuações do comerciante quanto à demissão por seu não comparecimento. Desta provável atitude decorre pressão psicológica acarretando em abalo emocional no funcionário, caracterizando-se assim o assédio moral.  
Rebatendo este argumento, Paulinho apresenta a possibilidade de contratação de diaristas, o que geraria mais renda e experiência para as pessoas que estão fora do mercado de trabalho. Além disso, os empresários poderiam fazer destes períodos um teste para a possível contratação de mão de obra. Porém, de acordo com a ala opositora, estas contratações serão mais uma abertura para demissões, já que esta vaga que poderia surgir indica ser exatamente a daquele funcionário que não tem comparecido aos domingos e feriados.

Em meio a tantas discussões, o fato de Paulinho do Destak ser também empresário do ramo varejista, dono de supermercado, é um dos aspectos que aumenta o debate e abre para a possibilidade do vereador ser suspeito quanto a advogar em causa própria. Todavia, o regimento interno da Câmara de Vereadores deixa claro em seu artigo 105, no paragrafo 5º, que: “Tratando-se de causa própria ou assunto de interesse individual deverá o vereador dar-se impedido de fazer comunicação à mesa, sendo o seu voto considerado em branco para efeito de quórum”. Assim, o documento impede qualquer vereador de votar projetos de seu interesse. Mas, o vereador Paulinho responde a esta observação que, como representante do povo, seu interesse é puramente coletivo.

Outra observação levantada de todo este embate é que Irecê é uma cidade fragilizada quanto à fiscalização no âmbito do trabalho. A Superintendência Regional do Trabalho e Emprego fica em Feira de Santana e o Ministério Público do Trabalho (MPT), ao qual a cidade se reporta, fica em Barreiras. De acordo com Rafael Sydartha, sequer há um auditor fiscal para fazer cumprir a lei no município. Com esta dificuldade, o caminho é procurar diretamente a Justiça do Trabalho, porém se houvesse uma fiscalização local efetiva, certamente problemas seriam evitados, ou resolvidos com mais rapidez.

Além disto, a Diocese de Irecê através de uma carta se posicionou contrária à abertura do comércio aos domingos e feriados. Também concordando com este posicionamento, a Igreja Presbiteriana esclarece em seu documento de apoio ao SECIR que a proposta do vereador Paulinho “levaria aos empregados infringirem seus princípios de culto, prejudicaria seus valores e relações familiares, como também seria nociva à saúde dos mesmos”.

O que ocorre em âmbito nacional é inverso ao que se pretende em Irecê, uma vez que as centrais sindicais do país e o governo federal discutem atualmente a redução da jornada de trabalho de 44 para 40 horas semanais, sem diminuição de salários e objetivando criar novos empregos. A alteração da jornada de trabalho é vista como instrumento de distribuição de renda, mais oportunidades no mercado, redução nas doenças ocupacionais e no número de acidentes.

Na medicina do trabalho, qualidade de vida é o que trabalhador precisa para desempenhar bem a sua função. Tempo significa a possibilidade dele se dedicar a outras atividades como estudo, convívio familiar, lazer, que ajudarão na melhoria da vida e do desempenho profissional. Além disso, preservar a integridade física, mental e social dos trabalhadores é fundamental para o crescimento do país.

Em Irecê, com este cenário controverso, a proposta de Paulinho de aprovar em lei o trabalho aos domingos e feriados está nas mãos de uma comissão especial de vereadores da situação,formada no dia 20 de maio, por Léo da Unibel (PSDB), Margarida (PTN) e Toinho do Judô (PRB) e será votada já com emendas no dia 06 de junho. A segunda votação ocorrerá na seguinte sessão da Câmara, quando definitivamente será aprovada ou não.


Fonte: jornal2pontos.blogspot.com.br

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